segunda-feira, 13 de setembro de 2010

A história de uma adoção especial

Olá, pessoas! Faz tempo que não apareço por aqui, e devo desculpas a vocês. As coisas andaram meio corridas por conta da avaliação do primeiro semestre do curso de pós-graduação da ABJL. Produzi uma matéria sobre os alojamentos do Jardim Santo André, um bairro de Santo André. Ela será publicada no site do Texto Vivo, por isso não posso disponibilizá-la aqui ainda. Mas se alguém quiser ler antes, é só me pedir por e-mail. Tirei nota 9,5! *.*

Hoje venho contar a história de um casal que adotou uma criança em Santo André. Não falarei muita coisa para não estragar a surpresa da matéria.

Boa leitura!


A história de uma adoção especial

Ou como a vida de uma família de Santo André mudou com a chegada do tão esperado filho e das surpresas que isso proporciona


Por Camila Galvez

Foto: Luciano Vicioni


- Temos um menino, branco, 10 meses, saudável. Interessa?

Foi assim que Maria Helena Barizon Ferreira e José Alberto Ferreira Filho encerraram a espera de cinco anos para adotar uma criança em Santo André.

- Parece uma mercadoria, um produto que estavam oferecendo. Mas não importa, porque no fim das contas, deu certo.

O pai avalia assim, mas a mãe não ligou para o jeito como as funcionárias do Fórum de Santo André falaram. Afinal, guardaria para sempre aquela data na mente: 12 de julho de 2006. Foi neste dia, em ano de Copa do Mundo, que começou a realizar o sonho de ser mãe. Sonho esse que começou bem antes, em 1997, quando passou por quatro inseminações artificiais para tentar produzir o que a natureza teimava em não fazer sozinha: uma gestação.

As lembranças dessa época não são boas. Além da angústia da expectativa, Maria Helena sentia-se muito mal com os vários medicamentos que tinha de tomar para realizar o procedimento. Na igreja católica que frequenta, começou a gestação de uma ideia: por que não adotar?

- Pensei que Deus queria me dar um filho, mas talvez não por vias naturais, e sim um filho do coração.

Assim, o casal resolveu desistir da quinta inseminação e deu entrada com o pedido de adoção no Fórum. Passou pelos mesmos procedimentos que as 7.652 famílias do Estado de São Paulo que integram o Cadastro Nacional de Adoção, que hoje tem 1.510 crianças na fila, 400 só no ABCD (leia mais abaixo). A disparidade entre os números ocorre porque a maioria das famílias quer crianças com características específicas: meninas, brancas e com até três anos de idade. Embora a exigência tenha caído quase pela metade em um ano e meio, ainda é realidade: 38% dos futuros pais que estão na fila em todo o País só aceitam crianças brancas.

O pequeno Cauê, uma criança branca, era uma raridade, embora Maria Helena e José Alberto não fizessem exigências em relação à cor do bebê. Só queriam que ele tivesse até três anos. Maria Helena não entende por que demorou tanto para que aparecesse uma criança. Quando enfim o casal foi convidado para conhecer o bebê, ele tinha 10 meses de idade e uma pneumonia. Veio conhecê-los um pouco sujo, magrinho demais e com o nariz escorrendo, mas foi amor à primeira vista. Maria Helena não se conteve:

- Vem com a mamãe, pequeno!

E assim se iniciava uma rotina pela qual o casal ansiou muito. Mas essa rotina ainda viria carregada de surpresas e se tornaria bastante “especial”.

Todo dia, o dia todo
Cauê crescia, mas Maria Helena sentia que havia algo errado. Com um aninho o menino ainda não conseguia firmar o pescoço e as costas para se sentar. Precisava ser apoiado em travesseiros, como se vê na foto de seu primeiro aniversário, que Maria Helena me mostra orgulhosa. Ele já aparece com as bochechas mais gordinhas que na primeira foto que o casal tirou dele, logo quando chegou. Mas a preocupação com o desenvolvimento de Cauê só crescia na mente dos pais.

- Logo após o primeiro aniversário, levamos o Cauê ao neurologista, a pedido da pediatra. O neuro fez uma série de exames e nos sugeriu que procurássemos um psicólogo. O Cauê já tinha movimentos repetitivos e certa tendência a ficar alheio, o que trouxe às nossas vidas, pela primeira vez, a palavra autista.

O casal não sabia o que significava a síndrome, caracterizada por desvios de comunicação, atenção e imaginação, mais frequente em meninos do que em meninas, e cujos primeiros indícios ocorrem antes dos três anos de idade. Os autistas têm dificuldades de interagir com as pessoas, possuem comportamentos estereotipados, obsessão por partes de objetos, problemas na dicção, ausência ou pouca expressão facial, podem ser agressivos e apresentam inflexibilidade em quebrar rotinas.

Cauê tem hoje quatro anos e horários definidos para tudo, todo dia, o dia todo. Come um danoninho sentado no colo da mamãe e dentro do carro do papai após as refeições. Faz tratamentos com fisioterapeuta, psicólogo, fonoaudiólogo e ainda tem tempo para a equoterapia. Estuda em escola comum e deve começar a fazer musicoterapia em breve. Tudo bancado pelo papai.

- E não pesa no bolso, Alberto?

- Por enquanto dá para pagar. Espero que continue assim.

O próximo passo é readequar a nova casa, que está sendo construída ao lado da residência dos pais de Maria Helena, para que Cauê possa ter mais autonomia. O menino que brinca com um violão de brinquedo irá se orientar por meio de figuras que serão espalhadas pela casa. No bebedouro, o desenho de água. Nas gavetas, cada uma com um tipo de vestimenta, desenhos de meias, cuecas, camisetas, bermudas e calças. E assim continua o aprendizado diário da família. Afinal, como Alberto costuma dizer:

- Aprendemos mais com o Cauê que ele conosco.


400 crianças esperam por um lar na Região

Os abrigos das cidades do ABCD têm hoje 400 crianças e adolescentes à espera de uma nova família. Em contrapartida, 411 casais estão interessados em adotar na Região. A conta parece fácil, mas as exigências das famílias em relação ao sexo, idade e cor da pele dos menores diminuem a chance de que ganhem um novo lar.

São Bernardo é a cidade com mais crianças e adolescentes disponíveis para adoção: são 194, com 175 casais interessados em adotar. Em seguida vem Mauá, com 81 crianças e 27 casais; Diadema, com 45 crianças e 38 casais; São Caetano, com 39 crianças e 44 casais, Ribeirão Pires, com 25 crianças e nove casais; Santo André, com 16 crianças e 113 casais, e por último, Rio Grande da Serra, que não tem nenhum menor disponível para adoção no momento, mas tem cinco famílias interessadas.

Em Santo André, o Grupo de Apoio à Adoção Laços de Ternura, da Angaad (Associação Nacional dos Grupos de Apoio a Adoção), é coordenado pela advogada Shirley Van der Zwaan. Foi fundado pela Federação das Entidades Assistenciais de Santo André em 2001 e é considerado referência para pais e pretendentes à adoção na Região. O objetivo do grupo é orientar, subsidiar e acompanhar adotantes e pretendentes para que as adoções tenham êxito, contribuindo para que mais crianças e adolescentes possam desfrutar do direito de ter um lar.

De acordo com Shirley, o projeto tem registrado resultados significativos que vão desde a colocação em família substituta de crianças tidas como inadotáveis, até a desistência de postulantes à adoção, que com a ajuda do grupo, reconheceram-se como pessoas despreparadas. “Muitos pretendentes à adoção, depois de participar dos encontros do grupo, alteram no cadastro da adoção o perfil da criança pretendida, flexibilizando-se não simplesmente para aumentar as chances de terem um filho, mas porque acreditam que é possível amar uma criança independente de sua idade ou da cor da sua pele”, destacou a coordenadora.

Na Região, as cidades de São Bernardo e São Caetano também contam com grupos de apoio da Angaad.

Um comentário:

  1. Adorei Camila! Essas histórias me deixam muito emocionada e me fazem acreditar cada vez mais nas pessoas!

    Parabéns aos pais e que o Cauê continue crescendo lindo e saudável! E lembrando sempre: ter um filho autista não é o fim do mundo. O Lucas me ensinou isso e a cada dia aprendo mais com ele!!

    Beijos

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