quinta-feira, 10 de março de 2011

Ensaio Pessoal

Ensaio Pessoal também é Jornalismo Literário. O ensaio abaixo foi minha primeira tentativa, produzido durante a maravilhosa aula do Edvaldo Pereira Lima.

Enquanto leio o livro O ano do pensamento mágico, de Joan Didion (recomendo), continuo buscando inspiração para lembrar se algum episódio da minha vida valeria um ensaio pessoal. Tenho alguns em mente, mas acho que nenhum forte o suficiente para ser um TCC dessa pós que, por si só, transformou a minha vida em todos os sentidos.

É, eu sumi. As coisas andam meio complicadas, ando meio sem tempo de mergulhar no Jornalismo Literário como gostaria. Por enquanto, faço um convite para que mergulhem um tiquinho dentro do oceano que sou eu. E descubram...

Por que escrevo?

Por: Camila Galvez

Uma folha quadriculada, de papel pautado, seis linhas preenchidas com espaço entre cada uma delas. Letra meio desgrenhada de criança, mas redonda. Lá estava o espantalho feliz, sorrindo pra mim. Desenho nunca foi o meu forte, mas pintava com gosto. O problema era que muitas vezes cansava de forçar o lápis no meio do caminho. A força maior sempre dediquei às letras pequenas no papel.

Tinha sete anos e um mundo de possibilidades se desenrolava diante de mim: a folha quadriculada e pautada era um passaporte que me levaria sempre para a mesma viagem, não importa o que eu escreva. A viagem era sempre para dentro de mim.

- Parabéns, Camila! Vou mostrar seu texto para as outras salas, está ótimo.

Mostrar minha primeira redação para as outras salas? Que erro! Me acostumei com a ideia de que gosto de ser lida, gosto de saber que agrado, que organizo as palavras como se elas pudessem ser domadas. Como seu fosse capaz de dominá-las. Essa é a impressão que quero passar quando escrevo: de que faço tudo de maneira consciente, medida, pensada. Que emprego técnicas, métodos, meios e fins estéticos para alcançar aquele resultado.

A impressão que meu texto passa, porém, é falsa como uma nota de R$ 3. As palavras sempre me devoraram. Escrever o que gosto é me deixar levar por elas, deixar que elas façam esse estranho balé mental todas as vezes antes de se deitarem sobre o papel que as coloco, imortalizadas ali até o próximo cesto de lixo, seja real ou virtual.

Tenho um exército de letras à disposição, e é com elas que satisfaço minha necessidade crescente e constante de escrever sempre mais e melhor. Mas é um exército sem general, e eu também sou um soldado. Caminho com as letras e preciso delas para ter força. Sem a dominação que elas mantêm sobre mim, quem seria eu?

Não seria, com certeza, a adolescente que a partir dos 12 anos ganhou os três concursos de redação da escola em que estudava. A sala de leitura que eu havia devorado, pequena demais para mim, era o palco para minhas leituras interpretativas. Rostos de expectativa me estimulavam a prosseguir com meu teatro até o fim, sempre trágico, meu exército cumprindo o papel não apenas de me dominar, mas de dominar os que me ouvem e leem.

Vivi com a ficção escrevendo em primeiro lugar para mim, e para os outros logo em seguida. Não faz sentido escrever para não ser lido. Escrever cansa, dói a mão, a cabeça, às vezes até as idéias doem. Se não houvesse o prêmio, o fato de saber que as palavras também dominam os outros como elas me dominam enquanto escrevo, nada faria sentido.

Se perdi horas e dias escrevendo baseada em histórias de outros – e dos outros - foi porque quis ser lida. É egoísmo, e não há porque ter vergonha de dizer. Encontrar reconhecimento no próximo. Alcançar a dominação pelas letras, esses sinais gráficos tão traiçoeiros, é o que todo escritor almeja alcançar no fim.

- Prima, hoje perguntaram na loja que fui fazer compras se eu era parente da Mia Galvez.
- Como assim? Sério?

- É! É por causa do meu sobrenome no cartão de crédito, a menina reconheceu e disse que adora suas histórias.

O exército ganhou mais uma vez, mas não sem deixar um rastro de morte pelo caminho. Eu caio junto com ele todas as vezes, mas levo outros mortos comigo também. A palavra domina. Escrever é um ato egoísta. E humano.

Nenhum comentário:

Postar um comentário